exposição
Os fios do fundo do mar
Vanessa Barragão expõe no Centro Comercial Colombo

Mergulho. As Paisagens de Vanessa Barragão é a mais recente exposição do projeto “A Arte Chegou ao Colombo”. Até 31 de agosto, as esculturas têxteis da artista algarvia mostram-se ao público na praça central do centro comercial lisboeta.
As lojas abriram há menos de uma hora e a movimentação vai-se espalhando, sem pressa, pelo Centro Comercial Colombo. Na praça central, não parecem ser as montras nem os saldos a atrair as atenções, mas sim umas tapeçarias imponentes que lembram seres vindos do fundo do mar. Mergulho. As Paisagens de Vanessa Barragão mostra o trabalho da artista algarvia, no âmbito do projeto “A Arte Chegou ao Colombo” – peças feitas com desperdícios de lã (algumas delas expostas pela primeira vez) e que vão deixando fascinados os que por ali passam.
“É muito interessante ter uma exposição no centro comercial, porque significa que as pessoas não têm de ir ao museu para ver arte. É o museu vem até elas e acredito que isso lhes desperte um lado mais artístico. Às vezes, até pode fazer diferença nas suas vidas”, afirma Vanessa Barragão. “Penso que pode até ser uma inspiração para muita gente, já que a maioria não acredita que desenvolver estas técnicas antigas possa ser um trabalho e, aqui, mostro que sim”, continua a artista de 33 anos, que aprendeu croché em criança com as avós. “Nós, jovens, devemos lançar um novo olhar sobre estas técnicas”, sublinha Vanessa, que tirou o curso de Design de Moda e sempre gostou de fazer as suas próprias roupas à mão.
A viver em Albufeira, onde nasceu, desde cedo que olha para o mar como uma inspiração. Quando começou a explorar artisticamente o croché, a esmirna e outros pontos de agulhas, foi lá que encontrou o imaginário que reinterpreta nas suas obras, usando-as também como uma chamada de atenção. “A minha ideia é relembrar como o oceano é lindo e como o planeta onde vivemos é maravilhoso. Somos os principais causadores da sua destruição, mas se não nos esquecermos de quão belo é, talvez seja mais fácil querermos defendê-lo.”
Tapeçarias com vida
Mergulho. As Paisagens de Vanessa Barragão está organizada em três partes distintas e, ao longo da exposição, podemos ver a evolução do trabalho da artista desde o início e a forma como as suas peças foram ganhando força e tridimensionalidade. “Comecei a fazer tapeçarias simples, numa tela, e depois tapetes para o chão, mas fui explorando outras técnicas. As mais recentes são menos estáticas, parece que respiram e ganham vida”.
Num dos lados da praça central, podemos ter uma ideia de como é o seu ateliê em Albufeira e como funciona o processo criativo, assim como espreitar as ferramentas e os materiais que usa. Numa das paredes, uma peça ainda em construção; mais ao lado, um monte com fiadas de lãs; noutra parede, algumas fotografias, incluindo um retrato da equipa de oito pessoas que Vanessa juntou (entre elas, o avô, a mãe e a irmã).
Do outro lado da exposição, está o espaço a que a artista chama o white cube, uma zona branca com as peças na parede, como se se tratasse de um museu ou galeria. É aqui que se exibe uma das tapeçarias mais especiais desta coleção. Perpétua tem tons de branco, bege, rosas e verdes claros e, com um olhar atento, descobrem-se, penduradas, pequenas pérolas em forma de lágrima. Vanessa batizou-a com o nome da avó, falecida no ano passado, uma das que a guiou nos primeiros pontos e que acompanhou de perto o seu trabalho. A avó Perpétua chegou mesmo a colaborar no início desta peça, que depois ficou de lado até a neta ter voltado a ela recentemente. “Foi ela a pioneira, ensinou-me a fazer croché e foi a partir dessa experiência que nasceu o meu gosto pelas artes manuais. Esteve sempre comigo no ateliê. Perpétua é uma homenagem que lhe faço.”
Mergulho profundo
Entre estas duas zonas da mostra, fica a sala imersiva de Mergulho, que faz arregalar ainda mais os olhos de quem entra neste espaço a meia luz e se vê envolvido pela música e os vídeos inspirados nas obras de Vanessa – um ambiente com direção criativa multimédia do Grandpa´s Studio e composição musical de André Cardoso. Ali, podemos andar por entre as esculturas têxteis penduradas do teto e por entre tapetes no chão, a lembrar a diversidade da vida marinha: anémonas, esponjas e corais, rochas e vegetação, medusas.
“É uma parte mais sensorial. A ideia é que as pessoas descubram aquele lugar, tal como fazem quando estão a mergulhar”, descreve a artista. “É daí que vem o nome da exposição. Gostava que quem vem mergulhasse no meu trabalho, no meu processo criativo e nas peças, e que tivesse mesmo essa sensação de estar a mergulhar no oceano.”
Com tapeçarias expostas no aeroporto de Heathrow em Londres, na sede da ONU em Nova Iorque ou em museus na China, Vanessa Barragão vai costurando os seus fios de lã pelo mundo. Até 31 de agosto, o fundo do mar está já aqui, na praça central do Colombo. Bons mergulhos.