Este mundo num palco

'Amor e Informação' no Teatro Aberto

Este mundo num palco

Num ilustrativo mosaico composto por mais de cinquenta micropeças e dezenas de intermezzos, Caryl Churchill coloca para lá de uma centena de personagens às voltas com o amor e os afetos, com as superficialidades e tragédias da sociedade de consumo, com a política e os terrorismos, com a ciência e a tecnologia e com a memória humana que os smart phones que temos nos bolsos parecem fazer substituir.

Este é um mundo em que tudo se tornou mais veloz, mais imediato, mais efémero. Ecrãs tácteis ampliam-nos a realidade, comandos de televisão viciam-nos em zapping e quem não está on, está offline, ou seja, é como se não existisse. A troca de informação comanda a nossa vida, provém de todos os lados e de um cem número de fontes. Jorra tão brutalmente que a própria realidade já não é o que era. Nem mesmo a maneira como nos relacionamos com aqueles que amamos e queremos.

Todas estas constatações estão presentes na peça Love and Information, escrita em 2012 por uma das grandes dramaturgas britânicas contemporâneas, Caryl Churchill (n. 1938). Num ilustrativo mosaico composto por mais de cinquenta micropeças e dezenas de intermezzos, a autora coloca para lá de uma centena de personagens às voltas com o amor e os afetos, com as superficialidades e tragédias da sociedade de consumo, com a política e os terrorismos, com a ciência e a tecnologia e com a memória humana que os smart phones que temos nos bolsos parecem fazer substituir.

Fazer caber todo este nosso mundo num palco foi o desafio abraçado por João Lourenço, o encenador que confessa ter apostado nesta peça de Churchill porque gosta de se desafiar com aquilo que julga não conseguir fazer. “A autora não fornece qualquer indicação sobre cada uma das cenas”, sublinha, “e isso permite-nos uma ampla liberdade”. Sabe-se que tudo tem de se passar a um ritmo vertiginoso, ou não fosse esta uma “peça em zapping” onde o espetador parece experienciar a sensação caseira de estar em frente à televisão, deambulando sem norte pelos canais à distância de um toque no comando.

Mas essa velocidade (e aparente simplicidade) que caracteriza Amor e Informação não dispersa o olhar crítico sobre aquilo que nos rodeia. O humor fino das cenas, sempre pautadas pela dose certa de mordacidade e uma profunda e acutilante inteligência, colocam-nos perante nós mesmos, e os outros. A encenação hábil e engenhosa de João Lourenço realça essa leitura, e exponencia as interpretações “caleidoscópicas” do elenco, composto por 13 atores de diferentes gerações.

É teatro, sim. E tem o mundo todo lá dentro.