Rita Cabaço

A atriz sobe ao palco com 'O Cinema'

Rita Cabaço

Quando em 2010 se estreou no Teatro Experimental de Cascais, pela mão de Carlos Avillez, Rita Cabaço estaria longe de imaginar que, em tão poucos anos, já teria somado ao currículo participações em dezenas de peças e trabalhado com algumas das mais importantes companhias teatrais do país, como a Cornucópia, a Comuna ou os Artistas Unidos. Pela interpretação da jovem Klara, em Música de Frank Wedekind, sob direção de Luís Miguel Cintra, a atriz foi distinguida com o Prémio da Associação Portuguesa de Críticos de Teatro/2016. Agora, Rita Cabaço regressa ao palco, com O Cinema, da norte-americana Annie Baker, em cena no Teatro da Politécnica a partir de 3 de maio.

Em que momento da tua vida percebeste que irias ser atriz?

Foi uma descoberta que surgiu com o tempo. Em criança nunca me passou pela cabeça que queria ser atriz. Sem que consiga entender muito bem porquê, andava eu na escola secundária, e vejo numa revista o anúncio de abertura de audições para a Escola Profissional de Teatro de Cascais. Decidi experimentar e acabei por ficar. A partir dai, as coisas foram surgindo e, depois da minha formação, acabei por ficar cerca de um ano e meio no Teatro Experimental de Cascais (TEC), com o Carlos Avillez. Posteriormente, decidi-me pela licenciatura e ingressei na Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC).

Portanto, não foi a consumação de um sonho de criança…

[risos] Nada mesmo. É verdade que me divertia imenso a fazer teatro na escola, mas nunca pensei que fosse esse o meu futuro.

Em 2010 estreias-te numa produção do TEC…

É verdade, mas, apesar de circular por todo o lado que foi em As Bruxas de Salém [de Arthur Miller], a minha estreia fez-se com A Nossa Cidade, de Thornton Wilder, um espetáculo dirigido pelo Carlos, e que serviu como exercício de conclusão do curso, culminando três anos muito importantes na minha vida, tanto a nível profissional como pessoal.

Seguindo-se esse período no TEC, a tua carreira foi absolutamente vertiginosa, multiplicando-se a presença em produções de algumas das mais conceituadas companhias de teatro independente do país. Foi uma ascensão medida, controlada?

Há dias falava nisso a um amigo e confessava que a maior virtude foi não pensar, foi não tomar consciência de que tudo estava a acontecer ao mesmo tempo. Foram, de facto, muitos projetos em simultâneo, num curto espaço de tempo, e com maior ou menor dificuldade fui dando conta deles. Considero que, acima de tudo, tive sorte: as pessoas conheceram-me e quiseram trabalhar comigo…

Uma atriz afortunada.

Sem dúvida. [risos]

Referente a um trabalho de 2016, foste este ano distinguida com o Prémio da Crítica. O que é que mudou em ti?

Acima de tudo, fico profundamente grata pela Associação Portuguesa de Críticos de Teatro achar-me merecedora do prémio, ainda mais porque sucedo à Cristina Reis, uma pessoa que muito admiro e tenho como amiga. Comoveu-me, emocionou-me, mas não mudou nada na minha vida… A profissão continua a ser instável e não me garante, certamente, que daqui a uns seis meses tenha trabalho. Portanto, o que mexeu comigo foi a felicidade de saber que as pessoas viram ao espetáculo, gostaram e, de certa forma, estive à altura dele.

O espetáculo pelo qual foste distinguida acaba por ficar marcado por ter sido a última produção de palco da Cornucópia, uma casa que, aliás, conheceste muito bem…

Também por isso reconheço que este é um prémio que sabe muito bem. Música foi um espetáculo muito duro, muito difícil, que me marcou e desafiou como nenhum outro. Independentemente da distinção, é um espetáculo que guardarei para sempre na memória.

Também foi na Cornucópia que nasceu o “teu” Teatro da Cidade, uma companhia que fundaste com o Bernardo Souto, o Guilherme Gomes, a Nídia Roque e o João Reixa. Conte-nos um pouco da história desse projeto.

Para mim, continua a fazer sentido estar com essas pessoas: com o Bernardo e a Nídia estou desde Cascais e, depois na ESTC, onde conhecemos o Guilherme e o João. A seguir, na Cornucópia, voltámos a encontrarmo-nos, e nasce a vontade de criar qualquer coisa nossa. Acaba por ser lá que apresentámos a nossa primeira criação, Os Justos, de Albert Camus, um texto sugerido pelo Luís Lima Barreto. Agora, estivemos na Ribeira com Topografia, espetáculo que pretendemos levar pelo país, estando já confirmada a ida ao Festival de Almada, em julho.

“Considero que tive sorte: as pessoas conheceram-me e quiseram trabalhar comigo.”

 

Em maio, sobes ao palco com O Cinema, de Annie Baker. Que olhar tens sobre a peça?

É uma peça sobre três trabalhadores num velho cinema e o modo como eles vivem o dia-a-dia. Acima de tudo, o texto fala de como a necessidade de subsistência interfere no relacionamento entre as pessoas. Durante algum tempo reconhecemos a cumplicidade, e até a amizade entre aqueles personagens. Isso é muito bonito! Até que tudo é posto em causa, porque o que realmente importa é pagar a renda e ter algum dinheiro para comer. Afinal, é por isso mesmo que suportam aquele emprego.

Estas personagens parecem ter uma autenticidade que nos faz mesmo duvidar da ficção.

Acho que é precisamente isso que o Pedro [Carraca] queria ao colocar, literalmente, a plateia do cinema no palco. O texto salta do quotidiano para ali: eles falam da sua realidade e dos seus problemas, com a sua linguagem. E isso é muito, muito autêntico.

Depois de Punk Rock, de Simon Stephens, voltas a ser dirigida pelo Pedro Carraca.

É verdade. São peças muito diferentes, mas é sempre bom trabalhar com alguém com quem temos uma relação muito honesta e de mútua confiança. Sente-se isso no trabalho…

E, por falar em cinema, dentro em breve poderemos ver-te no grande ecrã…

Será no novo filme do Sérgio Tréfaut, baseado no romance Seara de Vento, de Manuel da Fonseca. Foi a minha primeira experiência a sério no cinema e, para mim, foi reveladora – adorei mesmo! E, é engraçado, o Sérgio convidou-me para o papel depois de me ter visto no Punk Rock.