Dina

Uma nova geração homenageia a cantora

Dina

No ano em que Dina celebra 40 anos de carreira, vários artistas da nova geração musical portuguesa juntam-se para reinterpretar os temas do primeiro álbum da cantora, Dinamite, de 1982, para além de outras 12 canções compostas entre 1980 e 2000. No dia 22 de março, Ana Bacalhau, B Fachada, Best Youth, Da Chick, D'Alva, Márcia, Mitó, Samuel Úria e Tochapestana homenageiam a obra da intérprete e compositora que encerra, nesta data, a sua carreira. A este propósito, estivemos à conversa com Dina para saber como olha para a nova geração de músicos, mas falámos também sobre alguns dos seus êxitos do passado.

Começou muito cedo a sua vida de artista, chegou até a fazer teatro na escola. Recorda-se do momento em que percebeu que queria fazer da música a sua vida?

Isso foi acontecendo, mas penso que foi na adolescência, quando se instala a insatisfação e nos refugiamos na música. Lembro-me que, quando fazíamos excursões na escola, mandavam-me sempre cantar a mim. Andei num colégio que tinha internato masculino e feminino, no Carregal do Sal, que apesar de tudo não era um meio tão fechado quanto isso. Havia um movimento estudantil, uma agitação nos cafés, e a música era central na vida dos adolescentes, ligava-nos. Na altura comecei a cantar e aprendi a tocar guitarra e foi assim que tudo aconteceu.

A Dina foi uma das pessoas que mais vezes deu voz a genéricos de novelas. O processo de composição de fazer músicas para um álbum ou para uma personagem é muito diferente?

Na primeira novela da RTP fui convidada para cantar o tema de uma miúda problemática, mas o genérico era cantado pelo Samuel. A canção a que dava voz era um tema da Rosa Lobato Faria e do Vítor Mamede. Depois, na TVI, fiz o genérico de Telhados de Vidro, e ainda mais duas ou três canções. É um processo muito diferente. Gosto muito de fazer músicas propositadamente para um personagem. Adoraria fazer a banda sonora de um filme. É muito interessante pegar no perfil de um personagem e construir a música de acordo com as nuancesdele. Foi um trabalho que me deu muito gozo fazer, mas entretanto as coisas mudaram. As editoras começaram a usar as novelas para divulgarem álbuns que estavam para sair. E deixou de haver inéditos.

Em 1992 participou no Festival da Canção com um dos seus maiores êxitos, Amor de Água Fresca. Diria que esta canção foi um marco na sua carreira?

Sem dúvida. Quis fazer uma canção para ganhar, e assim foi. A Rosinha (Lobato Faria) fez um cocktail de frutas muito engraçado… Considero que tenho dois ex-libris na minha carreira: Há sempre Música entre Nós, de 1981, que ainda hoje as pessoas conhecem, e Amor de Água Fresca que é transversal a várias gerações. É uma canção muito animada, muito fresca e que fala em fruta. Dá para fazer várias leituras dali [risos], é uma canção feliz, e, sem dúvida, um ícone.

“O que eu gosto nesta gente é o facto de serem descomprometidos com o sistema ao mesmo tempo que são muito comprometidos com o seu trabalho.”

Essa parceria entre a Dina e a Rosa Lobato Faria foi longa. Como era o vosso processo de trabalho?

Lembro-me que quando estava a fazer o álbum Aqui e Agora, tinha uma canção sem letra (sou mais compositora do que propriamente letrista). Mostrei a canção à Teresa Miguel das Doce, que me sugeriu que falasse com a Rosa. Sempre fui um bocadinho distraída da vida, e na altura não tinha noção de que a Rosinha andava metida nesta coisa das canções. Entretanto combinámos e a Teresa levou-me a casa da Rosa. Houve logo uma empatia enorme, e ela fez a letra com a maior das facilidades. A canção acabou por se chamar Acordei o Vento. Gostei logo da letra e de dizer as palavras dela. Nasceu daí uma enorme amizade, nem podia começar a tocar uma música ao pé dela, que ela começava logo a pensar na letra [risos]. Foi uma pessoa que serviu muito bem as minhas canções e que faz falta a muita gente.

Juntamente com a Rosa Lobato Faria, compôs o hino de dois partidos políticos. Alguma vez se arrependeu de ter emprestado a sua voz à política?

A única coisa que me magoou nesse processo foi que toda a gente reparou que eu dei a voz, mas no entanto toda a gente dava a cara e essas pessoas nunca foram questionadas. Lembro-me da Mafalda Veiga, do Pedro Granger, por exemplo. Isso incomodava-me um bocado, porque eu queria era que falassem da minha música. Somos cidadãos como outros quaisquer, temos direito a ter as nossas convicções. Não diria que estou arrependida, mas tinha feito as coisas de forma diferente, até porque fui muito penalizada por isso.

No dia 22 de março, é homenageada no São Luiz por Ana Bacalhau, B Fachada, Best Youth, Da Chick, D’Alva, Márcia, Mitó, Samuel Úria e Tochapestana. Como é que olha para esta nova geração de músicos?

O que eu gosto nesta gente é o facto de serem descomprometidos com o sistema, ao mesmo tempo que são muito comprometidos com o seu trabalho. Quando o Gonçalo Tocha me apresentou esta ideia, pensou logo numa homenagem, não com gente da minha geração, mas com gente desta nova geração de músicos. Gente que conhece e que gosta do meu trabalho. Quando conheci o B Fachada ele trazia o meu primeiro disco, em vinil. Lembro-me de lhe ter perguntado se ele conhecia o álbum, ao que ele me respondeu: ”conheço muito mais de ti do que tu de mim”. Fiquei orgulhosa, o B Fachada é um personagem. Por arrasto veio esta malta toda… Por exemplo, acho que o Samuel Úria tem um bocado da minha ‘cena’. Não digo que tenham ido beber à minha música, mas sabem quem eu sou, conhecem o meu trabalho e agradou-lhes a ideia de fazer este espetáculo.

Conhece as versões que eles vão fazer ou vai ser uma completa surpresa?

Como intérpretes e autores que são é natural que deem o seu cunho pessoal. Aliás, basta abrirem a boca para a música já não ser minha, passa logo a ser deles. Estou muito curiosa e ansiosa por ver as minhas músicas serem cantadas por esta malta toda [risos]. Vou estar em palco com eles a tocar. À partida também cantarei uma ou duas canções vamos ver…

Este concerto marca o encerramento da sua carreira. Sente que está na altura de dar lugar aos mais novos?

Exatamente por ser o encerramento da minha carreira é que faço questão de estar em cima do palco. Não tem a ver com isso, o que acontece é que tenho um problema de saúde que não me permite continuar a cantar. Tenho fibrose pulmonar há nove anos e isso limita-me enquanto cantora. Não posso estar em cima de um palco a tossir, simplesmente não dá. Mas vou terminar com chave de ouro, com esta malta toda a cantar as minhas músicas no São Luiz.