Os dias de João Próspero

As sugestões culturais do músico para esta semana

Os dias de João Próspero

Em 2024, o jovem músico João Próspero lançou, através da editora Carimbo Porta-Jazz, o seu disco de estreia, um trabalho inspirado pela obra do escritor japonês Haruki Murakami. Na semana que antecede o concerto no Jazz em Agosto, o contrabaixista partilha as suas sugestões culturais: um concerto, duas exposições, um livro e uma série de animação.

Apesar de jovem e ainda em começo de carreira, o compositor é considerado um músico de grande maturidade e solidez, como prova a sonoridade do seu disco de estreia Sopros. Fazendo-se acompanhar por Joaquim Festas (guitarra elétrica), Miguel Meirinhos (piano) e Gonçalo Ribeiro (bateria), João Próspero traz ao Jazz em Agosto a sua leitura da obra literária de Haruki Murakami. Neste concerto, agendado para 5 de agosto no Anfiteatro ao Ar Livre do

Jardim Gulbenkian, o quarteto irá navegar “entre a poesia e a tensão, o mistério e o dramatismo, a obsessão e a estranheza”, seguindo diversas pistas dos livros do escritor japonês para construir um repertório que procura “criar narrativas inquietantes e enigmáticas”.

Kris Davis Trio

Jazz em Agosto – Fundação Calouste Gulbenkian
2 de agosto

Enquanto músico de jazz, esta sugestão de João Próspero não surpreende. Trata-se de um concerto inserido no festival onde também irá tocar: “a primeira vez que ouvi a música de Kris Davis foi no disco The Distance de Michael Formanek, com o Ensemble Kolossus. Não me custa admitir a forma como me marcou e como, desde então, tenho seguido obsessivamente o trabalho da pianista, chegando a extrapolá-lo até para dentro do meu próprio universo musical”. Por coincidência, o trio de Davis irá tocar uns dias antes do quarteto de Próspero. “Quando me chegou aos ouvidos a vinda do seu trio ao Jazz em Agosto, tornou-se mais do que evidente que o encaixaria em qualquer recomendação musical que viesse a fazer ao longo de 2025″. Sobre o novo trabalho deste trio, o músico português tem o seguinte a dizer: “Run the Gauntlet é um perfeito retrato do ethos musical de Davis, onde a escrita é entusiasmante e a execução inabalável.”

Drag Race, 2023

Drag Race, de Joana Vasconcelos

Até 30 de novembro
Museu de Artes Decorativas Portuguesas da Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva

Conhecida pelas suas obras impactantes e surpreendentes, Joana Vasconcelos tem uma nova exposição, que não deixou o músico indiferente: “ É um nome incontornável do espólio artístico português e, nesse sentido, as minhas palavras nada trarão de novidade. O que me moveu neste seu último trabalho é a ligação que a artista estabelece entre os três pontos de um triângulo subversivo: carros clássicos, ornamentação barroca e a cultura drag. Neste novelo de mundos aparentemente incontactáveis, Vasconcelos funde o imiscível, criando um novo elemento, decorado a ouro e cachecóis plumas. Quem me conhece sabe que sou um acérrimo fã do drag e do transformismo e, como tal, revejo-me muito neste tipo de trabalhos.”

Variações para Carlos Paredes 

Até 18 de janeiro
Museu do Fado

“Apesar de ser português, acabei por nunca desenvolver uma grande afinidade pelo fado”, confessa-nos o músico de jazz. No entanto, “nos últimos tempos, a direção mudou ligeiramente e acabei por me ver confrontado por ele (há quem diga que era inevitável). Acima de tudo, o que me mais surpreendeu foi a estreita ligação que existe entre o fado e jazz, e que a minha ingenuidade nunca me permitiu ver, apesar de registos discográficos como Dialogues, que juntam o gigante Charlie Haden com o nosso, não menos impactante, Carlos Paredes.” A exposição Variações para Carlos Paredes, no Museu do Fado, é também “um convite para que me acompanhem aqueles de vocês que ainda não tenham sentido a força incontornável que é o Fado”, afirma.

A Boneca de Kokoschka

Livro de Afonso Cruz
Quetzal

O instrumentista sugere a leitura de A Boneca de Kokoschka, obra recomendada por um familiar num almoço de domingo. “Tendo recentemente terminado Pão Seco, de Mohamed Choukri (fica também a recomendação!), estava, por coincidência, a farejar novas possibilidades.” O livro segue a história de Isaac Dresner, “um jovem judeu que habita numa Alemanhã devastada pela Segunda Grande Guerra e que, depois de ver o seu amigo morrer a tiro, se refugia numa velha loja de pássaros onde, durante os próximos tempos, encarnará a esquizofrenia de Bonifaz Vogel, ensinando-lhe a arte de rezar e a de negociar o preço dos canários”. A Boneca de Kokoschka foi a porta de entrada para o universo de Afonso Cruz, cuja “habilidosa maneira de narrar retrata uma realidade surrealista e não muito distante”. Um livro marcante do ponto de vista do músico, que considera a escrita de Cruz “vibrante e tremendamente irónica”. “Gera uma leitura deliciosa, que certamente permanecerá comigo durante os próximos tempos.”

Monster  

Série de animação de Naoki Urasawa

“Um tipo de media fundamental, profundamente embebido na cultura nipónica são as mangas e as suas versões animadas, os animes”. Fã confesso da cultura asiática, João Próspero sugere “uma série dentro deste estilo que, para mim, será das melhores de todos os tempos”, diz. Trata-se de Monster, “um thriller psicológico a não perder”. A série “conta a história de um cirurgião japonês residente na Alemanha que, apesar de um futuro promissor como diretor de serviço, se vê confrontado com uma série de dilemas esmagadores que o fazem pôr em causa a integridade de toda a humanidade”. A forte relação do compositor com a cultura japonesa está bem presente no seu trabalho: “autores como Murakami, realizadores como Kurosawa, designers de jogos de vídeo como Kojima, são todos fontes de inspiração que orbitam pelo meu universo musical”.