Conto apenas com alegria
Inês Garrido

A imagem real e cronológica de uma mulher desde que ela nasce até que ela morre, 1957 – 2022. Esta imagem, de diferentes formatos e meios, acompanha a rápida evolução da fotografia
e registo vídeo dos últimos 60 anos.
Esta mulher nunca teve um quarto dela. Quando vivia com os pais, dormia no quarto de costura de sua mãe, numa cama dobrável, num colchão de folhelho. Depois disso, o quarto dela foi
sempre o seu quarto com o marido. No final, morreu num quarto com mais sete camas. Um morredouro que não deixava entrar uma brisa de ar nos dias quentes de Agosto.
A morrer, escreve num caderninho com uma letra torta e débil: “conto apenas alegria para com
a vida”. Quando ela morre, de todos os lados chegam histórias sobre o quanto ela transformou vidas à sua volta.
Ser mulher é também isto: não ser visível na transformação do mundo. A esta mulher não lhe foi
dada uma campa — ela não quereria. Antes, seguem vivos epitáfios inscritos em todos os
corações que ela, tirando de si mesma, fez crescer.
E olha, Mãe, que bonita é a antecipação do sonho!
Integrado no Festival Temps d’Images.
Ficha técnica:
Ermo do Caos. Criação e interpretação de Inês Garrido; cocriação de Miguel F.
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