Os livros de dezembro

Oito livros para o Natal

Os livros de dezembro

Com a aproximação do Natal, a Agenda Cultural de Lisboa selecionou oito novidades editoriais para oferecer e partilhar. Oito propostas para um presente perfeito de Natal. Leia e ofereça bons livros!

Orhan Pamuk

Noites de Peste

Orhan Pamuk nasceu no seio de uma família rica de Istambul, estudou no estrangeiro engenharia, arquitetura e jornalismo. Todavia, a partir de 1974, preferiu dedicar-se à literatura. Segundo a Academia Sueca, o autor foi distinguido com o Prémio Nobel da Literatura em 2006 porque, “na busca pela alma melancólica da sua cidade, descobriu novos símbolos para o confronto e o cruzamento de culturas”. Pamuk assina uma obra que descreve as tensões da sociedade turca, entre o Oriente e o Ocidente, e tem-se, repetidamente, pronunciado contra os fundamentalismos e pelo entendimento entre as culturas. Uma mensagem cuja importância é mais do que evidente na atual conjuntura e que vale para todos os fundamentalismos: religiosos, políticos ou étnicos. Noites de Peste, o mais recente romance, é ambientado no ano de 1901. A terceira pandemia de peste bubónica, que começou na China e matou milhões de pessoas em toda a Ásia, chega à ilha de Mingheria, “a Esmeralda de pedra rosa”, 29.º estado do Império Otomano onde imperam as tensões entre ortodoxos e muçulmanos. Pamuk indaga as pandemias do passado nesta história de sobrevivência e luta sob as proibições da quarentena, a instabilidade política, a insurreição, o crime e as ânsias de liberdade. Presença

Rahel Sanzara

A Criança que se perdeu

Publicado originalmente em folhetim e posteriormente em livro no ano de 1926, A Criança Que se Perdeu é um dos primeiros romances psicológicos modernos, baseado num caso verídico que ocorreu na Alemanha do século XIX. Um jovem, filho de uma empregada de uma grande propriedade familiar, sente uma atração perturbadora por uma menina de 4 anos, atração que terá o homicídio como terrível consequência. Rahel Sanzara (1894-1936) bailarina, atriz e escritora, popular figura no meio artístico da República de Weimar, influenciada pelos diversos estudos de psicologia infantil, e pelas teorias de Freud, disseca na presente obra as causas e os efeitos do crime, da culpa e do perdão. Este romance perturbador e influente ganhou o Prémio Kleist, que a autora recusou, e foi um dos maiores best-sellers da primeira metade do século XX, traduzido em onze línguas. Sobre ele escreveu Peter Handke, Prémio Nobel de Literatura em 2019: “A capacidade de mergulhar no âmago da psique do criminoso e da vítima faz deste romance um precursor do policial psicológico e uma profunda meditação sobre a faculdade humana de perdoar.” E-Primatur

Guy de Maupassant

Yvette

Iniciado por Flaubert, que lhe ensina as exigências da estética realista, Guy de Maupassant (1850-1893) produz dois clássicos no domínio do romance – Uma Vida (1883) e Bel Ami (1885) – mas destaca-se principalmente como um dos melhores contistas de sempre, elevando o género à perfeição. Bola de Sebo, A Casa Tellier ou Mademoiselle Fiffi são obras-primas incontestadas do género. Alcança, através do seu estilo naturalista e da sua visão pessimista da existência, um poder e uma força raramente igualados. Minado pela sífilis, tenta suicidar-se antes de ser internado num manicómio, em 1892, onde acaba os seus dias. Segundo José Saramago, seu tradutor, Maupassant escreve “como se a si próprio se destroçasse, como se de si próprio se apiedasse”. Na notável novela Yvette, publicada em 1884, o elegante Jean de Servigny é um boémio que frequenta a sociedade da “aristocracia do cárcere” e da “prostituição dourada”. Nesse meio infame conhece a bela e misteriosa Yvette. Absolutamente desconcertado com o à-vontade tranquilo e triunfante da jovem, interroga-se: será ela um monstro de astucia e perversidade ou o mais maravilhoso fenómeno de inocência? Relógio D’Água

Paula Tavares

Poesia Reunida

Paula Tavares é uma escritora consagrada não apenas em Angola, Portugal e Brasil, mas em vários outros países onde se encontra representada em diversas antologias. Com 12 obras editadas – um romance, um dicionário em prosa afetiva, três livros de crónicas e sete títulos de poesia – a autora introduziu em Angola, desde Ritos de Passagem (1985), uma nova voz poética que repensa a questão da sexualidade reprimida das mulheres e não se exime de refletir sobre a crise que afeta o corpo social do seu país. A sua obra encontra-se, ainda, ligada aos sentidos profundos das origens e assume um sentido de resistência no que respeita à preservação das tradições. A presente edição reúne a poesia publicada de Paula Tavares e acrescenta ainda um livro de originais, Água Selvagem. Carmen Lucia Tindó Secco escreve no prefácio: “Herdeiro tanto das tradições orais angolanas, como da poesia de David Mestre em sua modernidade literária, o lirismo de Paula Tavares funde provérbios ancestrais do povo de Angola com dissonantes figuras de linguagem que primam por elaborado trabalho estético”. Uma obra poética que tem na figura da tecedeira uma metáfora recursiva: “Estico até à seda / o fio das palavras / as palavras são como os olhos das mulheres / fios de pérolas ligadas pelos nós da vida.” Caminho

Michael Onfray

Sabedoria: Saber Viver ao Pé do Vulcão

“Vivo na província, na Normandia, longe das distrações mundanas de Paris. (…) Trabalho todo o tempo, sempre sozinho. Não tenho fins-de-semana, nem férias. Praticamente não vou ao cinema, nem ao teatro, nem à ópera, infelizmente. Viajo por todo o Mundo para fazer conferências e trabalho nos aviões e nos hotéis.” (Público, 13.05.2017) Assim se explica, e mesmo assim é merecedora de espanto, a produção literária do filósofo francês Michel Onfray (n. 1959), que já ultrapassou a centena de livros sobre os mais variados assuntos. Sabedoria: Saber viver ao pé de um vulcão tem uma densidade incomum num livro de autoajuda, e um sentido de aplicação prática invulgar para uma obra filosófica. Talvez resida aqui a chave para a popularidade de Onfray, além do conhecimento enciclopédico deste autor que se orgulha de ler exaustivamente a respeito dos indivíduos e dos temas sobre os quais se propõe escrever. Os ilustres romanos deste livro (Múcio Cevola, Plínio: o Velho, Séneca, Cícero, e vários outros) servem a Onfray para dar exemplos de como devemos enfrentar os desafios e as provações da vida, não o fazendo pelos seus escritos mas pelos atos de que foram protagonistas. [Ricardo Gross] Edições 70

Kurt Vonnegut

Pequeno-Almoço de Campeões

Kurt Vonnegut (1922-2007), herói da contracultura americana, senhor de um estilo muito pessoal e imaginativo, apelidado de “wide screen baroque”, misto de pessimismo, sátira e humor negro, integra frequentemente nos seus livros elementos de ficção científica numa vasta reflexão sobre a guerra, a condição humana e a impossibilidade de falar verdade. Pequeno-Almoço de Campeões é um romance delirante que narra o encontro trágico entre Kilgore Trout, um escritor de ficção científica tão profícuo como anónimo, e Dwayne Hoover, um bem-sucedido vendedor de automóveis. Num dos seus livros, Trout desenvolve o conceito de que todas as pessoas no universo são robôs e que só uma é dotada de livre-arbítrio. O escritor descobre aterrorizado que Hoover, ao interpretar literalmente a sua teoria, está a enlouquecer. Tudo isto se passa, claro está, no planeta Terra onde não há “imunidade a ideias parvas”. Vonnegut cria mais uma sátira original e poderosa, tão seria quanto cómica, à sociedade norte-americana à beira da insanidade, tentando sobreviver, há tanto tempo, “com uma dieta de dinheiro e sexo e inveja e imobiliário e futebol e automóveis e televisão e álcool.” Alfaguara

Rodrigo Guedes de Carvalho

As Cinco Mães de Serafim

Rodrigo Guedes de Carvalho regressa ao tema da família e da morte, em As Cinco Mães de Serafim, o seu mais recente romance. Passada entre a Foz do Douro e Gondarém, a história começa em 1923, com o nascimento de Maria Virgínia Landim da Silva, a mãe de Miguel Serafim, um filho tardio que pensava ter cinco mães, resultado da forma como foi cuidado pelas suas quatro irmãs – Benilda, com 20 anos, Bernarda com 17, Berenice, com 18, e Benedita, com 17. Educadas em casa pela mãe, que parecia querer escondê-las do mundo, Serafim foi o único que frequentou a escola, tendo-se tornado num exímio maestro por influência do pai. Entre saltos temporais, chegamos a 2023, ano em que Serafim completa 60 anos e se prepara para organizar, em conjunto com os seus dois melhores amigos, de quem se separou aos 19 anos, a festa do centenário da mãe. De sangue azul a ferver na guelra desde pequena, Maria Virgínia era uma mulher fria que não queria saber da opinião de ninguém, apenas ouvindo o seu primo, o padre Gonçalo Garcia, com quem partilhava segredos inconfessáveis que o filho quer agora deslindar. “Talvez a amizade seja um outro nome para família. Talvez a amizade seja um outro nome do amor.” Afinal, o que é uma família? [Sara Simões] Dom Quixote

Jorge Marçal da Silva

A Dimensão Imersiva

Homem de grande cultura, Jorge Marçal da Silva nasceu em Lisboa, a 30 de junho de 1878, onde também viria a falecer. A par da profissão de cirurgião, Marçal era um melómano e apreciador de ópera, que desde cedo se dedicou à fotografia, revelando e preparando ele próprio as suas imagens no laboratório de fotografia que tinha em casa. De lugares e temas bastante variados, as suas fotografias constituem-se como “um património histórico, sociológico, etnográfico, cultural, um testemunho de um Portugal de há cem anos, num tempo muito diferente nas suas diversas realidades e contraste.” Entre 1906 e 1927 realizou centenas de fotografias estereoscópicas, que o Arquivo Municipal de Lisboa – Fotográfico deu a conhecer na exposição Jorge Marçal da Silva – A dimensão imersiva, patente entre abril e setembro deste ano. Da mostra, resultou o presente catálogo que dá a conhecer a história pessoal deste cirurgião e fotógrafo amador, cujo rigor e gosto pela investigação inerentes à profissão aplicou à fotografia, e permite descobrir uma prática fotográfica pouco divulgada. Profusamente ilustrado, o livro contém uns óculos e um visor para que possa visualizar as imagens em 3D. CML – Divisão de Arquivo Municipal