Um arquiteto de Lisboa

O legado de Nuno Teotónio Pereira nos Itinerários de Lisboa

Um arquiteto de Lisboa

Quem foi Nuno Teotónio Pereira e que obras assinou na capital? É a resposta a estas questões que um itinerário guiado por Lisboa o convida a conhecer. Inserido no programa municipal Itinerários de Lisboa, Nuno Teotónio Pereira – um arquiteto de Lisboa traça, em alguns locais emblemáticos, os principais aspetos da vida e obra de um dos mais importantes arquitetos portugueses da segunda metade do século XX.

Nascido em Lisboa, em 1922, no seio de uma família da alta burguesia, Nuno Teotónio Pereira foi um arquiteto visionário para a sua época, revelando desde muito cedo o desejo de se libertar do meio conservador em que crescera e de transformar o mundo que o rodeava – aos 16 anos é admitido na Escola de Belas-Artes de Lisboa, no curso de Arquitetura, e aos 20 deixa de assinar Theotónio com “h”, rompendo assim a tradição familiar.

Católico progressista, Teotónio Pereira foi um dos cofundadores e dirigentes do MRAR – Movimento de Renovação da Arte Religiosa. Um grupo, composto sobretudo por arquitetos e artistas plásticos, que pretendia promover a modernidade e uma maior qualidade plástica na arte e edifícios religiosos em Portugal, em oposição aos modelos tradicionalistas promovidos pelo Estado Novo.

Capela do Rato
Capela do Rato

Homem de paz, Teotónio Pereira foi um dos mentores da Vigília da Capela do Rato, um protesto contra a Guerra Colonial levado a cabo na noite de 31 de dezembro de 1972 para 1 de janeiro de 73, que abalou a ditadura do Estado Novo.

Do Bloco das Águas Livres ao Franjinhas

e à nova conceção de templo religioso

Obra ímpar da arquitetura moderna portuguesa, classificada como Monumento de Interesse Público desde 2012, o Bloco das Águas Livres, situado na Praça das Águas Livres e Rua Gorgel do Amaral, surgiu da vontade da Companhia de Seguros Fidelidade querer apostar num edifício de qualidade para um público de “alto standard”. Projetado em conjunto com Bartolomeu da Costa Cabral, e inspirado nas ideias de Le Corbusier, os arquitetos decidiram fazer uma unidade de habitação em altura, cuja construção decorreu entre 1953 e 1957.

Uma arquitetura moderna, de linhas simples e depuradas, em que a escultura, a pintura e a própria arquitetura cooperam para um mesmo fim. Com oito pisos de habitação e quatro ateliês no topo, possui ainda um andar preenchido por escritórios. A união da sala de estar com a sala de jantar, à qual acrescentaram uma varanda com uma vista soberba sobre a cidade, a existência de uma lavandaria (entretanto caída em desuso), de uma sala de condomínio/convívio e condutas de lixo, foram algumas das inovações presentes.

Bloco das Águas Livres
Bloco das Águas Livres

Para compensar o despojamento do Movimento Moderno, e a diversidade de materiais como a pedra, o betão, a cortiça e o ferro, entre outros, os arquitetos acrescentam à construção do Bloco de Águas Livres obras de arte de cinco artistas: dois painéis de mosaico vidrado de Almada Negreiros, um vitral de Manuel Cargaleiro, um painel de Frederico George, baixos-relevos de Jorge Vieira e um painel de betão esgrafitado de José Escada.

Painel de Almada Negreiros
Painel de Almada Negreiros (interior do Bloco das Águas Livres)

Construído entre 1966 e 1969, o edifício Franjinhas é outra das obras emblemáticas de Teotónio Pereira, tendo sido projetada com João Braula Reis. Prémio Valmor em 1971, o edifício situa-se entre a Rua Braamcamp e a Rua Castilho, chamando a atenção pela extravagância da fachada recortada, pela rudimentaridade do acabamento e pela forma como o piso térreo se relaciona com o exterior. Também aqui se encontram algumas obras de arte para compensar a fealdade dos materiais à vista, nomeadamente um mural de Eduardo Nery.

Edifício Franjinhas
Edifício Franjinhas

Construída na década de 60 do século XX, em substituição de outra com a mesma invocação, a Igreja do Sagrado Coração de Jesus faz parte de um complexo paroquial que apresenta, para além dos espaços dedicados ao culto, uma secretaria, umas cafetaria, capelas mortuárias, um auditório e ainda outros espaços para atividades socioculturais, ou não fossem estas algumas das características dos trabalhos do arquiteto lisboeta, que neste caso partilhou o projeto com Nuno Portas.

Também distinguida com Prémio Valmor (1975), esta obra destaca-se não só pelo uso exclusivo de materiais nacionais como pelo cuidado que houve em relação aos espaços de circulação, nomeadamente, no exterior, com a ligação entre a Rua Camilo Castelo Branco e a Rua de Santa Marta.

Igreja do Sagrado Coração de Jesus
Igreja do Sagrado Coração de Jesus

Organizada por pisos, em representação das várias fases da vida humana, a igreja apresenta uma ampla nave trapezoidal de altura considerável; por baixo desta, a cripta, onde podemos apreciar uma imagem de São Miguel Arcanjo, atribuída ao escultor Machado de Castro, e o cartório; e, na base, o salão paroquial e a capela mortuária. A igreja possui ainda um belo órgão, atualmente a necessitar de manutenção.

São Miguel Arcanjo, oferta de Machado de Castro
Imagem de São Miguel Arcanjo

Nuno Teotónio Pereira deixou-nos ainda a Torre dos Olivais, o Quarteirão Rosa no Restelo, a Igreja de Nossa Sr.ª da Assunção em Almada, ou a renovada estação de metro e fluvial do Cais do Sodré, entre tantas outras obras.

Paralelamente à arquitetura, durante a ditadura foi por diversas vezes detido por criticar publicamente as políticas do Estado Novo, sendo um dos cofundadores do MES – Movimento de Esquerda Socialista. Juntamente com a sua segunda mulher, Irene Buarque de Gusmão, fez um importante levantamento sobre os “Pátios e Vilas de Lisboa”. Faleceu em 2016, deixando um conjunto de obras marcantes por toda a cidade.

Incluído no programa municipal Itinerários de Lisboa, promovido pela Direção Municipal de Cultura da Câmara Municipal de Lisboa, Nuno Teotónio Pereira – um arquiteto de Lisboa tem agendado próximas datas a  2 e 24 de fevereiro, 31 de março, 20 de abril, 5 de maio, 15 de junho e 7 de julho. Outras informações e inscrições podem ser feitas através do email itinerarios.culturais@cm-lisboa.pt.