reportagem
Juventude inquieta
Os menores de 30 que estão a dar que falar
Reconhecendo a importância do papel que os jovens desempenham na sociedade, a União Europeia instituiu 2022 como o Ano Europeu da Juventude. E que melhor forma de o celebrar, senão apresentando alguns dos novos rostos do panorama cultural nacional?
Nesta reportagem, damos voz a artistas e projetos que têm, em comum – para além do seu amor pelas artes – o facto de terem todos menos de 30 anos. Falámos com uma artista plástica, uma bailarina, um escritor, três atores e uma banda. Todos com talentos diferentes, mas com o mesmo objetivo de servir a arte que escolheram. Quisemos conhecer o seu percurso profissional, que dificuldades enfrentam neste contexto pandémico, e o que andam a fazer. Decore estas caras, porque elas vão, com toda a certeza, marcar a vida cultural do país nos próximos tempos.
Sogranora
músicos
Em 2016, Ricardo Sebastião, Vasco Gomes e Tomás Andrade treinavam no mesmo clube de basquete no Seixal, quando decidiram, por graça, formar uma banda. Inicialmente, começaram por tocar versões de outros artistas, mas perceberam que, se queriam levar o projeto a sério, teriam de compor as suas próprias canções.
Assim, em 2019, nasciam, oficialmente, os Sogranora. O single de estreia, Semilisboeta, surgiu pouco depois. A pandemia afastou-os fisicamente, mas não lhes cortou a criatividade: durante esse tempo, aproveitaram para compor, cada um em sua casa, e daí surgiu o EP Altivez e Castigo.
Para a banda funcionar, é essencial que haja um bom espírito de equipa, seja com Ricardo a compor as letras e Vasco e Tomás mais responsáveis pelos arranjos, ou com os três a darem ideias durante os ensaios. Para março, está previsto o lançamento de mais um EP, e respetivo concerto de apresentação no Seixal (de onde são naturais). O primeiro single já é conhecido, Qualquer impasse.
Alice dos Reis
artista plástica e visual
Tinha apenas 23 anos quando organizou a sua primeira exposição individual, na Galeria da Boavista. Alice dos Reis cedo percebeu que o seu caminho profissional seria “associado a um contexto criativo e cultural”, o que a levou a estudar na Escola Artística António Arroio. Seguiu-se uma licenciatura em Arte e Multimédia na Faculdade de Belas-Artes, e uma mudança para Amsterdão, onde fez um mestrado em Artes Plásticas.
O vídeo e a fotografia são as suas ferramentas de eleição, e o seu trabalho “acaba por ser autorreferencial”, o que a leva a explorar temas que lhe interessam a nível pessoal, como a natureza, tecnologia, identidade e género. A pandemia trouxe-lhe alguma “frustração e uma sensação de perda de um conjunto de experiências”, mas não lhe faltou trabalho. Dirige, com Pedro Neves Marques, a editora literária e de poesia Pântano, dedicada a livros inéditos em inglês e traduções para português, projeto que a tem feito sentir “bastante completa”. Encontra-se ainda a trabalhar num filme e prevê, este ano, fazer residências artísticas fora do país.
André Loubet
ator
André Loubet tinha 19 anos quando participou na sua primeira peça, uma produção do Teatro do Bolhão, no Porto. Começou a sua formação na Academia Contemporânea do Espetáculo, e seguiu-se o Conservatório.
Uma visão mais romântica da profissão levou-o a privilegiar o Teatro desde cedo, “uma escolha adolescente e algo inconsciente”, admite. É nesta área que se sente bem, mas reconhece que a televisão dá uma outra segurança, de “não andar sempre a contar trocos ao fim do mês. Trabalhar em teatro não dá para perspetivar o futuro a longo prazo”, mas, ainda assim, não se queixa da falta de trabalho.
Mesmo durante a pandemia – e ao contrário de muitos dos seus colegas de profissão – não perdeu rendimento por estar a trabalhar numa coprodução entre o TNDMII e os Artistas Unidos. Em janeiro, esteve em cena com a peça Obstrução (textos de Dimítris Dimitriádis), uma produção dos Artistas Unidos no Teatro da Politécnica. Tem uma criação sua na gaveta que espera ter tempo para desenvolver e apresentar ainda este ano.
João Arrais
ator
Em criança, João Arrais sonhava ser jogador de futebol. Tinha sete anos quando fez o seu primeiro anúncio, mas era a irmã que tinha o sonho de ser atriz. No entanto, a vida tinha planos diferentes para os dois: ela estudou Psiquiatria, ele foi crescendo como ator.
Com 10 anos, participou na sua primeira novela, Jura, exibida pela SIC. Na área da representação já fez de tudo: televisão, cinema, e teatro, mas é à frente das câmaras que se sente bem. O palco traz-lhe outro tipo de gratificação, mas não diz que não a nenhum desafio.
Esteve, há não muito tempo, em cena com o espetáculo Romeu e Julieta, de John Romão. A pandemia não lhe tirou trabalho, mas atrasou o começo da rodagem do filme A Criança, que poderemos ver nas salas portuguesas já este mês (estreia prevista para 10 de fevereiro). Sobre o seu futuro próximo, o ator não pode revelar muito, mas ficámos a saber que vai participar num projeto que estreia em breve na OPTO.
Margarida Serrano
atriz
Margarida Serrano tinha apenas cinco anos quando fez o seu primeiro anúncio para televisão. Dois anos depois, participou na primeira telenovela. A partir daí, os projetos foram-se sucedendo. Nunca teve o sonho de ser atriz, até o ser e perceber que gosta mesmo de representar.
Durante a pandemia continuou a trabalhar, mas alguns hábitos tiveram de ser alterados no set e nos bastidores, com um distanciamento físico a que não estava habituada. Já fez teatro, cinema e televisão, mas onde se sente mais confortável é a trabalhar para as câmaras. Quem a vê no ecrã pode não acreditar, mas é muito tímida e insegura. “O teatro traz consigo um peso maior e isso deixa-me nervosa”, confessa.
Com apenas 14 anos e uma vida inteira pela frente, as suas opções profissionais ainda estão em aberto: “adoro o que faço e vou, sem dúvida, continuar a apostar na formação nesta área, mas não sei o que o futuro me reserva”. Para já, podemos vê-la em A Serra (em exibição na SIC), e, ainda este ano, na série Emília (a ser transmitida pela RTP).
André Osório
escritor
Um texto que escreveu na escola, e que recebeu largos elogios, levou-o a escolher Humanidades no ensino secundário. Aos 14 anos, André Osório mergulhou no mundo da poesia quando o pai, o jornalista e escritor Luís Osório, lhe deu a ler poemas de Herberto Hélder. Começou também a escrever, até que a própria literatura começou a fazer parte da sua identidade.
Os seus primeiros poemas foram publicados na revista Apócrifa, quando tinha apenas 19 anos. Entretanto licenciou-se em Estudos Portugueses e, em 2020, lançou o seu primeiro livro, Observação da Gravidade (Guerra e Paz), muito bem recebido pela crítica. Durante a pandemia aproveitou para fazer uma tradução e para pensar no que se seguiria.
Neste momento, André divide-se entre a sua escrita e a revista literária Lote, que fundou em 2019. Está também a trabalhar numa antologia de poetas portugueses. Na sua mesa de cabeceira encontram-se As Viagens de Gulliver, de Jonathan Swift, e O Livro das Comunidades, de Maria Gabriela Llansol.
Beatriz Valentim
bailarina e coreógrafa
Com apenas quatro anos, Beatriz Valentim iniciou-se no ballet na sua cidade natal, Póvoa do Varzim. Aos 14, depois de muito insistir com os pais, mudou-se para Lisboa para frequentar o Conservatório e perseguir o sonho de ser bailarina. A integração no mercado de trabalho não foi fácil e sentiu a idade jogar contra si, já que muitas das audições a que ia pediam alguns anos de experiência ou uma idade mínima que ainda estava longe de ter.
Aos 19 anos, estreou-se no espetáculo Propriedade Privada, de Olga Roriz, no Centro Cultural de Belém, ao lado de bailarinos com mais de 30 anos. Outro trabalho que a marcou foi A Laura quer!, de Sílvia Real, onde destaca “a maneira de trabalhar inteligente e intensa” que lhe ensinou “muito sobre o próprio processo criativo”.
A pandemia tirou-lhe o chão, muitos projetos ficaram em suspenso, e para ter alguma segurança financeira deu aulas online. Em fevereiro, podemos vê-la no palco do São Luiz em Concerto Nº1 para Laura, de Sílvia Real. Este ano vai ainda participar num projeto de Né Barros, e apresentar duas peças da sua autoria.