Encantadores de Crianças

Eles trabalham para o público mais exigente do mundo

Encantadores de Crianças

Se é verdade que, neste momento, o mundo parece um lugar estranho, não é menos verdade que os mais pequenos são quem se adapta mais facilmente às mudanças que nele acontecem. Mas há coisas que nunca mudam, apesar de todas as restrições que enfrentamos: é impossível pensar no Natal sem o associarmos às crianças...

Por isso, neste mês de dezembro, a Agenda Cultural de Lisboa foi conhecer o trabalho de seis artistas, das mais variadas áreas, que criam e trabalham especialmente para o público mais difícil do mundo. É que trabalhar para e com miúdos pode ser uma alegria e um desafio, até porque, muitas vezes, eles vêem as coisas através dos olhos que os adultos se esquecem que existem.

Catarina Oliveira e Ana Sofia Santos

Designer e cenógrafa | atriz e produtora

Ana Sofia é atriz e produtora, Catarina tem a seu cargo o design e a cenografia. Juntamente com Noélia Fernandes, responsável pela dramaturgia, e com vários atores profissionais, dão corpo à Cativar, uma associação cultural que cria peças de teatro para a infância. Com enredos originais ou a partir de histórias tradicionais, a Cativar apresenta espetáculos que integram movimento, música e muitos finais felizes, nunca esquecendo o lado educativo e pedagógico. A principal mais-valia da associação, que promete sempre exibições muito divertidas e lúdicas, é a capacidade de, graças à portabilidade e adaptabilidade dos seus cenários, levarem as peças às escolas, nomeadamente a creches e jardins de infância. Os espetáculos da Cativar têm também presença assídua na Fábrica Braço de Prata aos fins de semana e, este mês, apresentam naquele espaço as peças Pinheirinho de Natal (dias 5 e 12, às 11h) e A Loja dos Sonhos de Natal (dias 19 e 26, às 11h). Através de fantoches, personagens dinâmicos e marionetas, os espetáculos da Cativar fazem as delícias de miúdos… e graúdos.

Rodolfo Castro

O pior contador de histórias do mundo

Argentino a viver em Portugal, Rodolfo Castro sempre quis ser o melhor contador de histórias do mundo. E, para ser o melhor, estudou, treinou, trabalhou e… não conseguiu. Então, pensou que se não conseguia ser o melhor, podia ser que conseguisse ser o pior. Estudou, treinou, trabalhou e… conseguiu! “Eu sou o pior contador de histórias do mundo: conto as piores histórias do mundo ao pior público do mundo”, assim se apresenta este habitante do conto. “Esta denominação tem a ver com o registo com que eu trabalho e que está um bocadinho fora do politicamente correto para crianças. São histórias muitas vezes provocadoras, transgressoras, até mesmo cruéis, que têm muito a ver com a minha visão do mundo e que gosto de partilhar com os mais pequenos. E eles alinham, gostam mesmo muito, porque as crianças são muito cruéis.” Rodolfo também escreve e, nos últimos tempos, tem feito ainda trabalhos de ilustração, tendo mesmo já editado alguns livros que começaram por ser histórias orais mas que, devido à sua aceitação, decidiu passar para o papel.

Rui Ferreira “Oliveirinha”

Ator e clown

Define-se como investigador na área do clown, do teatro físico e manipulação de objetos e, durante o seu percurso, já fez vários espetáculos de autoria própria, workshops e formações. Tem também subido a palcos mais específicos, como os contextos hospitalares: “Oliveirinha” é Dr. Palhaço e diretor artístico na Associação Remédios do Riso desde 2014 e,  desdramatizando, leva o riso e a fantasia a crianças hospitalizadas. Homem dos sete ofícios, dirige atualmente o curso de Técnicas Circenses para famílias, no Chapitô, que surgiu a partir da sua vontade de criar oportunidades de envolvimento entre pais e filhos, proporcionando um momento de aprendizagem, mas também de convívio entre famílias. “Trabalhar com crianças é, para mim, uma escolha inata. O percurso do clown está inevitavelmente ligado ao imaginário infantil. Além disso, trabalhar a arte com e para as crianças permite-nos fomentar o papel decisivo da arte na educação social, na gestão sensorial, na construção emocional do  indivíduo. A arte está para as crianças como a água está para as plantas – é uma necessidade inata. E o contacto com elas torna-nos indubitavelmente pessoas melhores, fazendo do mundo também um lugar melhor.”

Severino Moreira

Pai Natal

De barba branca e ar bonacheirão, Severino Moreira veste a pele de Pai Natal há muitos anos, alegrando há já duas décadas aqueles que chegam nesta altura do ano ao Centro Colombo. Severino acredita que personificar o Pai Natal “não pode ser só vestir-se de vermelho. O Pai Natal deve empenhar-se para dar credibilidade à personagem, porque quanto mais credível for, mais corresponde ao sonho e à expectativa das crianças. Lidar com os mais pequenos é lidar com um mundo maravilhoso, onde a surpresa é constante, e eles merecem, seguramente, o melhor de nós.” Infelizmente, Severino não tem só histórias boas para contar e considera importante falar desta realidade: “se vivo momentos de muita satisfação, muita alegria e muito regozijo, também tenho momentos de alguma tristeza, nomeadamente quando me chegam situações de violência familiar.” No entanto, considera que é pelo facto de poder viver esta amálgama de experiências que lhe dá um enorme prazer fazer de Pai Natal. “Cada dia é um dia diferente e ainda que chegue ao fim do dia tantas vezes fatigado, termino-o com a alma cheia.”

Madalena Matoso

Ilustradora

Madalena Matoso é ilustradora. Na maior parte das vezes, de livros. “Sempre tive muito interesse pela relação entre palavras e desenhos. Como se contaminam, mudam, influenciam, questionam, revelam ou escondem por estarem perto uns dos outros. Uma palavra ou uma ideia podem ser ilustradas de muitas formas diferentes. A imagem pode fugir da palavra e esconder-se, pode ser um eco da palavra, pode ser um espelho (deformado ou não), podem caminhar juntas e podem não concordar em tudo.” Madalena gosta de combinações palavras/imagem intrigantes e com algum mistério, como se pode ver no seu mais recente livro, O gnu e o texugo — Cuidado com o vento (texto de Ana Pessoa, edição da Planeta Tangerina), onde há duas histórias que, ao irem pelos ares, ficam todas baralhadas. Os desenhos são iguais em ambas as narrativas, mas, afinal, já não são bem os mesmos. Muitos dos livros que ilustra são para crianças, mas talvez não sejam só para crianças. “Interessa-me a infância por ser um tempo de curiosidade, de experimentação. Ali, está tudo em aberto.”

Paulo Cordeiro

Músico e professor

Paulo Cordeiro integra o projeto Música para Bebés, organizado pelo Conservatório de Música de Sintra e que leva sessões de música às Bibliotecas Municipais de Lisboa, ao Museu de Lisboa e não só. Recorrendo a canções, com ou sem palavras, a melodias e a padrões rítmicos, estas aulas e sessões pontuais com pais e bebés promovem um ambiente musical diverso e uma experiência de partilha em família e contribuem para o desenvolvimento de capacidades musicais, em paralelo com a aquisição das primeiras palavras e frases. “É na primeira infância e infância, no fundo até aos cinco anos, que privilegiadamente se estabelecem as bases do nosso vocabulário musical, daí que a frequência de aulas regulares de música para bebés assuma um papel muito importante no desenvolvimento de competências que são intrínsecas em cada um de nós, mas que precisam de ser estimuladas desde tenra idade”. Aliás, como diz o ditado, é de pequenino que se torce o pepino!