Sara Correia

"Não fui eu que escolhi cantar o fado, foi o fado que me escolheu."

Sara Correia

Se ainda não conhece a fadista Sara Correia, não sabe o que está a perder. A cantora, de apenas 25 anos, gravou recentemente o seu primeiro disco, homónimo, com produção de Diogo Clemente. Fomos ouvir esta nova voz do fado. Se a quiser conhecer também, a fadista sobe ao palco do Capitólio no próximo dia 21 de fevereiro.

Como é que o fado entrou na tua vida?

Isto vem de família, tenho o sangue do fado a correr-me nas veias. Costumo dizer que nem sei bem quando é que começou, porque vou a casas de fado desde os três anos. Lembro-me de, com seis ou sete anos, ouvir discos de fado em casa da minha tia (a fadista Joana Correia). Com oito ou nove anos comecei a passar as letras para um caderno para decorar o que a minha tia cantava. Aos 13 anos entrei na Grande Noite do Fado. Venci e aí tive a certeza de que era isto que queria para a minha vida.

Essa participação na Grande Noite do Fado foi um momento de viragem?

As pessoas que me rodeavam sempre me incentivaram para continuar, mas sim, fez-se um click, soube que era mesmo isto que queria.

Comparas muito as casas de fado com o ritual de ir à missa…

Fadista que se preze precisa de ir às casas de fado, porque é onde ele realmente acontece. É onde convivemos com fadistas com mais experiência, é ali que vamos beber o que precisamos para subir ao palco. Para além disso, tem um ambiente mais intimista, estamos mais próximos do público. Gosto muito de estar em palco, é onde me sinto ‘eu’. Sou muito ansiosa, mas quando subo ao palco isso desaparece.

O teu álbum de estreia tem merecido rasgados elogios por parte da crítica. Estavas à espera de uma reação tão calorosa?

De certa forma estava à espera de boas críticas, porque sei o trabalho que fiz. Foram três anos investidos neste trabalho. O que mais queria era fazer este disco tal e qual ele saiu, e passar uma mensagem para jovens da minha geração que não ouvem fado. Sinto que as pessoas jovens que vieram agora para o fado e que estão a começar o seu caminho também bebem muito de mim, e isso é incrível. Foi sempre isso que quis, poder ser considerada uma influência. Só tenho 25 anos, embora muita gente me ache mais velha…

Achas que isso está relacionado com a ideia que muita gente tem de que o fado é para pessoas mais velhas?

As pessoas não sabem o que é a essência do fado, não conhecem… É importante que quem vive no meio, como eu, consiga mostrar um pouco da história. Há um grande desconhecimento em relação à história do fado. Costumo dizer que não fui eu que escolhi cantar fado, foi o fado que me escolheu, isso é notório no meu percurso. Além de gostar muito de cantar, o meu grande objetivo era passar uma mensagem, despoletar esta curiosidade nas pessoas: procurem saber mais sobre o fado porque há muito para saber!

O facto de o fado ser, essencialmente, uma música com uma tradição e um ritual associado, afasta as gerações mais jovens?

Penso que esse afastamento se deve à imagem que o fado sempre teve. As roupas pretas, pesadas, os vestidos compridos, as letras tristes… Lembro-me de ser miúda e de algumas pessoas me dizerem não era música para a minha idade. Hoje em dia, o fado tem uma roupagem muito mais leve. As letras são mais atuais, os fadistas já se apresentam de outra forma… Essa mudança era necessária, mas claro que há marcas muito tradicionais que se devem manter. Acho que a roupa não define o fadista nem ninguém que cante. Não me faz confusão se a pessoa canta de saia ou de calças, mas há um certo cuidado que se deve ter. Cada pessoa deve ter a sua identidade e o seu gosto próprio. O fado está na voz, não está na roupa.

O álbum homónimo da fadista é apresentado a 21 de fevereiro no Capitólio.

 

O disco tem a participação de Diogo Clemente e Ângelo Freire, dois nomes pesados do fado. Como chegaram a esta colaboração?

Já nos conhecemos há muito tempo e há muito que eles me diziam que, quando chegasse a altura, queriam gravar um disco comigo. O meu crescimento foi feito ao lado deles. A determinada altura senti necessidade de deixar alguma coisa minha, um registo. Acho que é necessária uma certa maturidade e alguma experiência, não só no fado mas na música em geral. É preciso ter uma história para contar às pessoas. Tenho 25 anos, tenho muito ainda para viver, mas senti que já estava preparada para fazer um disco. Já tenho 15 anos de fado, estava na altura certa. Comentei isto com o Diogo e ele também achou que tinha chegado o momento.

Escolheste dar o teu nome ao primeiro disco. Porquê?

Primeiro, porque queria dar-me a conhecer como Sara Correia. Depois, porque a escolha dos fados tradicionais são quase autobiografias minhas, de histórias da minha vida. Pensei que não fazia sentido estar à procura de um mote para este disco. O mote sou eu, Sara Correia, tal e qual como sou.

Compararem-te à Amália é o maior elogio que te podem fazer?

É, mas é também uma grande responsabilidade. Não gosto de comparações. Tenho as minhas referências, como qualquer pessoa. Para mim, a D. Amália Rodrigues é a essência do fado, o seu expoente máximo, desde sempre que a canto. Gravei, inclusivamente, o Fado Português, que pensei várias vezes se devia gravar ou não.

Estavas com receio?

Estava, porque há canções que é impossível fazer melhor. Aquilo que a D. Amália fez é perfeito, o que coloca a fasquia altíssima, mas pensei: “porque não?”. Da mesma forma que gravei fados de outros fadistas que admiro muito.

No dia 21 de fevereiro apresentas este disco no Capitólio. Como vai ser este espetáculo?

Vou fazer umas coisas novas, estou a preparar umas surpresas, mas sempre à volta do cantar fado claro, que é aquilo que sei fazer.

O que te traz o futuro?

Neste momento estou focada neste disco, mas já tenho ideias para o próximo, porque isto não pode parar… Agora estou focada em promover o disco e em dar concertos. Já tenho algumas coisas marcadas, irei novamente atuar no Caixa Alfama, em breve vou estar na Noruega e em Viena de Áustria… É engraçado que o público lá de fora gosta muito de fado. Mesmo não percebendo o que estamos a cantar, é quem mais pede os fados tradicionais, o fado puro e duro.

Qual é a sala de sonho para um fadista?

Tenho muitos sonhos, mas não tenho nenhum palco de sonho. O meu sonho é cantar em palcos, seja onde for, seja para que público for. Esse é o meu sonho: poder cantar para os outros. Conhecer outros artistas, outras culturas musicais.